O Teatro
Variedades avança, ainda este ano, para obras de requalificação, anunciou o
presidente da Câmara de Lisboa. Ao mesmo tempo, vai avançada a reabilitação do
Teatro Capitólio, convertido em Teatro Raul Solnado, mesmo em frente do
Variedades. Entretanto, o Teatro Maria Vitória tem vivido aos soluços.
De resto,
fechou tudo no Parque, menos o restaurante da Gina. Morreram os últimos
habitantes, o cenógrafo e pintor de génio Mário Alberto, e a Mimi, coproprietária,
com as duas irmãs - Amadora e Vitória -, do que foi um simples e simpático bistrô.
O Parque Mayer
transformou-se num gigantesco e caótico estacionamento de automóveis, desde que
a Câmara fechou o Parque, desmantelou a Feira Popular e se meteu numa
embrulhada sem princípio nem fim de permuta de terrenos das duas áreas.
Perderam-se ambos os parques de diversões, entre negócios pouco claros e projetos
megalómanos. E a embrulhada de negócios para o espaço da Feira, em Entrecampos,
e a área do Parque, entre a Avenida da Liberdade e o Jardim Botânico, tornou-se
um romance de cordel com enredo difícil de acompanhar.
O facto de
estar um teatro em reabilitação e avançar outro para o mesmo destino no espaço
do Parque Mayer acende uma pequena luz ao fundo do túnel deste comboio-fantasma
que foram alguns projetos na grande e belíssima cidade de Lisboa.
Texto e fotos
Beco das Barrelas. D.R.
Ver também:
Parque Mayer que já foste
Mensagem
do Dia Mundial do Teatro - 2013
Há muito tempo, o Poder mostrou a sua
intolerância para com os actores da Commedia dell’Arte expulsando-os do
país.
Hoje em dia, actores e companhias sentem
grandes dificuldades em encontrar palcos e teatros públicos, bem como
espectadores, e tudo por causa da crise. Portanto, os governantes já não estão
preocupados em controlar os que se exprimem pela ironia e pelo sarcasmo, uma
vez que, não havendo lugar para os actores, não há público a quem se fale.
Pintura mural no espaço do Parque Mayer, em Lisboa |
Ao contrário disto, durante o
Renascimento, em Itália, os detentores do poder tiveram de fazer um esforço
considerável para manter os Commedianti na ordem, uma vez que gozavam de
ampla audiência.
É facto sabido que o grande êxodo dos Commedianti
dell’arte aconteceu no século da Contra-Reforma, que decretou a destruição
de todos os espaços teatrais, especialmente em Roma, onde foram acusados de
ultraje à cidade santa. Em 1697, o Papa Inocêncio XII, pressionado por
insistentes pedidos da ala mais conservadora da burguesia e dos altos
representantes do clero, ordenou a destruição do teatro de Tordinona onde,
segundo os moralistas, se tinha levado a cena o maior número de peças obscenas.
Na época da Contra-Reforma, o cardeal
Borromeo, em funções no Norte da Itália, consagra-se com empenho à redenção dos
«filhos de Milão», estabelecendo um distinção clara entre a arte, enquanto mais
alta forma de educação espiritual, e o teatro, manifestação de blasfémia e
vaidade. Numa carta dirigida aos seus colaboradores, que cito de memória,
escreve mais ou menos isto: “Nós, que nos preocupamos em extirpar a erva
daninha, envidámos os maiores esforços para lançar ao fogo todos os textos
contendo discursos infames, erradicá-los da memória dos homens e, ao mesmo
tempo, perseguir também todos aqueles que divulgaram tais textos sob forma
impressa. É evidente que, enquanto dormimos, o Diabo trabalha com redobrada
astúcia. Quanto mais a alma se deixa impregnar pelo que os olhos vêem do que
por aquilo que se lê nos livros! Quão mais devastador para as mentes jovens e
rapariguinhas é a palavra dita e o gesto apropriado do que uma palavra morta,
impressa num livro. Portanto, torna-se urgente livrar as nossas cidades da gente
do teatro, tal com fazemos aos espíritos indesejáveis.”
Assim sendo, a única solução para a crise
reside na esperança de uma grande caça às bruxas dirigida contra nós e,
sobretudo, contra os jovens que querem aprender a arte do teatro: teremos então
uma nova diáspora dos Commedianti, dos fazedores de teatro, que sem
dúvida retirarão de tal experiência inimagináveis benefícios em prol de novas
formas de representar.
Dario Fo, Prémio Nobel da Literatura 1997
Tradução de Maria João da Rocha Afonso